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terça-feira, 21 de maio de 2013

Eurovisão - Dinamarca porque sim


Palavra que gostei mesmo. A canção era muito bonita. Foi aquela que preferimos logo desde o início. 
E que a Alemanha tenha evocado razões políticas para não ganhar, não me importa nada; aliás nem acredito. Além da supremacia económica e política, também estava com pretensões ao troféu da Eurovisão. Nada como um país periférico como a Dinamarca para fazer engolir as peneiras aos habituais grandes Alemanha, Rússia, etc.
É verdade: não basta um par de pernas (e outros "pares" avantajados) de uma cantora com aspeto de lutadora na lama como a Cascada para ganhar a Eurovisão, desde que os votantes tenham ouvidos. 
Prefiro as sonoridades das flautas que evocam mesmo florestas; e prefiro cantoras com aspeto de fadas; as fadas têm cabelos louros naturais, andam descalças e usam vestidos esvoaçantes. A Emmelie evocou tudo isso, além de cantar bem. E depois, vinha de um país da minha simpatia: a terra de Kierkegaard, de Andersen, da pequena sereia. Para já não falar da Lego e da Carlsberg...
Por todas as razões fiquei contente de não ser a Alemanha a levar a bicicleta e sim a Dinamarca. 
Ah, e já agora, gosto mesmo da canção, dos tambores, das flautas, do visual e dos recursos cénicos. Despojado, belo e simples. 

domingo, 19 de maio de 2013

A lucidez controversa de MEC

Preservar...
Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Chega-se sempre à primeira frase, ao primeiro número da revista, ao primeiro mês de amor. Cada começo é uma mudança e o coração humano vicia-se em mudar. Vicia-se na novidade do arranque, do início, da inauguração, da primeira linha na página branca, da luz e do barulho das portas a abrir.
Começar é fácil. Acabar é mais fácil ainda. Por isso respeito cada vez menos estas actividades. Aprendi que o mais natural é criar e o mais difícil de tudo é continuar. A actividade que eu mais amo e respeito é a actividade de manter.
Em Portugal quase tudo se resume a começos e a encerramentos. Arranca-se com qualquer coisa, de qualquer maneira, com todo o aparato. À mínima comichão aparece uma «iniciativa», que depois não tem prosseguimento ou perseverança e cai no esquecimento. Nem damos pela morte.
É por isso que eu hoje respeito mais os continuadores que os criadores. Criadores não nos faltam. Chefes não nos faltam. Faltam-nos continuadores. Faltam-nos tenentes. Heróis não nos faltam. Faltam-nos guardiões.
É como no amor. A manutenção do amor exige um cuidado maior. Qualquer palerma se apaixona, mas é preciso paciência para fazer perdurar uma paixão. O esforço de fazer continuar no tempo coisas que se julgam boas — sejam amores ou tradições, monumentos ou amizades — é o que distingue os seres humanos. O nascimento e a morte não têm valor — são os fados da animalidade. Procriar é bestial. O que é lindo é educar. Estou um pouco farto de revolucionários. Sei do que falo porque eu próprio sou revolucionário. Como toda a gente. Mudo quando posso e, apesar dos meus princípios, não suporto a autoridade. 

É tão fácil ser rebelde. Fica tão bem ser irreverente. Criar é tão giro. As pessoas adoram um gozão, um malcriado, um aventureiro. É o que eu sou. Estas crónicas provam-no. Mas queria que mostrassem também que não é isso que eu prezo e que não é só isso que eu sou. 

Se eu fosse forte, seria um verdadeiro conservador. Mudar é um instinto animal. Conservar, porque vai contra a natureza, é que é humano. Gosto mais de quem desenterra do que de quem planta. Gosto mais do arqueólogo do que do arquitecto. Gosto de académicos, de coleccionadores, de bibliotecários, de antologistas, de jardineiros. 

Percebo hoje a razão por que Auden disse que qualquer casamento duradoiro é mais apaixonante do que a mais acesa das paixões. Guardar é um trabalho custoso. As coisas têm uma tendência horrível para morrer. Salvá-las desse destino é a coisa mais bonita que se pode fazer. Haverá verbo mais bonito do que «salvaguardar»? É fácil uma pessoa bater com a porta, zangar-se e ir embora. O que é difícil é ficar. Isto ensinou-me o amor da minha vida, rapariga de esquerda, a mim, rapaz conservador. É por esta e por outras que eu lhe dedico este livro, que escrevi à sombra dela.
Preservar é defender a alma do ataque da matéria e da animalidade. Deixadas sozinhas, as coisas amarelecem, apodrecem e morrem. Não há nada mais fácil do que esquecer o que já não existe. Começar do zero, ao contrário do que sempre pretenderam todos os revolucionários do mundo, é gratuito. Faz com que não seja preciso estudar, aprender, respeitar, absorver, continuar. Criar é fácil. As obras de arte criam-se como as galinhas. O difícil é continuar. 

Miguel Esteves Cardoso [As Minhas Aventuras na República Portuguesa]

terça-feira, 7 de maio de 2013

Do exame da 4ª


(c) Olinda Gil, Sereia do Ilhéu

Agora é o 4º ano da escolaridade obrigatória. Com exame e tudo, como antigamente, na 4ª classe. 
Estive por lá, vi e participei, apesar de não ser professora do ensino básico.
Logo pela manhã, aportaram à Escola Secundária onde trabalho, magotes de crianças ruidosas, entre o entusiasmado e o curioso, pela novidade. 
Não só o espaço era novo  para aquelas crianças, como os professores e até o mobiliário. 
À sua dimensão, tudo se afigurava um pouco monumental, gigantesco mesmo; cerca de metade destes meninos passaram duas horas com as pernas a balançar no ar, os pés sem chegar a tocar no chão, numa posição de evidente desconforto. Tudo era tão estranho que houve mesmo quem chorasse e não fizesse nada de jeito. Outros, mais maduros, ou com mais capacidade de adaptação, lá se desenrascaram.
Vamos aguardar pela publicação dos resultados para ver quais são os ganhos efetivos que a introdução deste exame veio trazer. Ou se o show-off se saldou apenas por mais uma gigantesca operação de propaganda deste governo, o único que conheci até hoje a mandar pôr o seu símbolo nos cabeçalhos das provas.   
Não faço ideia quais os gastos que toda esta operação de logística acarretou, mas às vezes os gastos para este governo parecem importar muito, outras vezes, não faz mal! 
Na minha Escola várias centenas de alunos ficaram sem aulas e voltarão a ficar na sexta-feira, mas parece que também não faz mal. 
Faz de conta que veio um Papa e se deu tolerância de ponto, prontos!
Escolas houve em que se organizou visitas de estudo em massa para entreter os alunos cujas salas de aula estavam ocupadas com os seus colegas da primária a fazer exame.
Quanto se gastou? Quantas aulas se perdeu? Ora, isso não interessa nada! 
O que interessa é que se introduziu mais uma "medida de rigor", para preparar a criançada para a vida, ora pois! 
E, sobretudo, nada de confiar nesses "zecos" que enrouquecem nas salas de aula, para fazer das crianças homenzinhos e mulherzinhas, cultos e educados q.b. 
Essa malta, a quem o cabelo teima em embranquecer, e que despede a família às noites e aos fins-de-semana para fazer autênticas maratonas de correção de provas, na realidade só precisava era de uma boa desculpa para atrasar em cerca de dois dias mais uma dessas etapas, deixando no repouso da mesa de trabalho umas resmas de papel. 
E os alunos sempre estavam a precisar de uns feriados, pois isto de União Europeia só tem o nome e por cá nem sequer há férias de neve; assim sempre deu para um salto a Carcavelos a apanhar um valente escaldão! 

domingo, 5 de maio de 2013

Poema à Mãe

Poema à Mãe

No mais fundo de ti
Eu sei que te traí, mãe.

Tudo porque já não sou
O menino adormecido
No fundo dos teus olhos.

Tudo porque ignoras
Que há leitos onde o frio não se demora
E noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
São duras, mãe,
E o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
Que apertava junto ao coração
No retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
Talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
Que todo o meu corpo cresceu,
E até o meu coração
Ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -
Às vezes ainda sou o menino
Que adormeceu nos teus olhos;

Ainda aperto contra o coração
Rosas tão brancas
Como as que tens na moldura;

Ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
No meio do laranjal...

Mas - tu sabes - a noite é enorme,
E todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
Dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.



(poema Eugénio de Andrade/pintura Gustav Klimt)

sexta-feira, 3 de maio de 2013

António Vieira atual em 2013

 "Tudo quanto tenta e intenta o diabo em um poderoso, tudo leva ao cabo, ou seja nos pecados de homem, ou nos de ministro. Nos pecados de homem, se se ajunta o poder com o apetite, não há honra, não há honestidade, não há estado, nem ainda profissão, por sagrada que seja, que se não empreenda, que se não conquiste, que se não sujeite, que se não descomponha. E nos pecados de ministro, se o poder se ajunta com a ambição, com a soberba, com o ódio, com a vingança, com a inveja, com o respeito, com a adulação, não há lei humana, nem divina, que se não atropele, não há merecimento que se não aniquile, não há capacidade que se não levante, não há pobreza, nem miséria, nem lágrimas que se não acrescentem, não há injustiça que se não aprove, não há violência, não há crueldade, não há tirania que se não execute.” 

- Padre António Vieira, Sermão da Primeira Dominga do Advento [1652].

quarta-feira, 1 de maio de 2013

1 de maio, dia do trabalhador


Comemoro o dia do trabalhador trabalhando. 
Tenho 60 testes intermédios de Filosofia para classificar, com outros tantos descritores para, criteriosamente, estabelecer uma "avaliação externa".
Pergunto-me se a mesma é dos conhecimentos dos alunos ou da paciência - leia-se "resistência" - dos professores!
Ainda que de mau humor, vos desejo a todos um feliz dia do trabalhador! (Versejei!)