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sábado, 9 de março de 2019

Pedro Álvares Cabral partiu a 9 de Março


Caravelas da armada de Pedro Álvarez Cabral utilizadas na viagem de descoberta do Brasil. 
Livro de Lisuarte de Abreu, c.1558. The Pierpont Morgan Library, Nova York.

Depois de uma missa celebrada na ermida do Restelo, a que assistiram o rei D. Manuel e toda a Corte, a armada de Pedro Álvares Cabral zarpava da barra do Tejo, neste dia de 9 de Março de 1500, rumo a Calecut, viagem que resultou na “descoberta” do Brasil. 
O comandante, que então teria pouco mais de trinta anos, tinha a seu mando uma poderosa armada de 13 naus. O objetivo era realmente a cidade de Calecut, na Índia, onde era preciso reafirmar a dominação portuguesa depois da viagem de exploração que Vasco da Gama tinha realizado dois anos antes.

 Foto acima: Nau de Pedro Álvares Cabral/Wikipédia
Uma réplica da nau Capitânia da armada de Pedro Álvares Cabral pode ser visitada no cais do Centro Cultural da Marinha, no Rio de Janeiro.
É uma cópia, feita a partir de fontes iconográficas do século XVI, de uma das 13 embarcações que constituíam a frota de Pedro Álvares Cabral. A nau capitânia alberga agora uma exposição que pretende mostrar como era a vida a bordo na época. 


Partida de Pedro Álvares Cabral em 1500. Faiança Portuguesa- Prato da Fábrica de Alcântara, finais séc. XIX. 
Cortesia de Tita Fan

João de Deus




João de Deus de Nogueira Ramos nasceu a 8 de março de 1830, há 184 anos. 
Poeta e pedagogo, frequentou durante dez anos, o curso de Direito em Coimbra (onde foi uma das figuras mais destacadas da boémia estudantil da época e se relacionou com alguns elementos da Geração de 70, sobretudo Antero de Quental e Teófilo Braga).
Colaborou em vários jornais e revistas, e por volta de 1868-1869, as suas poesias foram coligida, por Antero de Quental, no volume “Flores do Campo”, a que se seguiram “Ramo de Flores” (1869), “Folhas Soltas” (1876), “Despedidas do verão” (1880) e “Campo de Flores” (1893).
Viria a desempenhar um papel social e cultural da maior relevância, nomeadamente no que diz respeito aos seus esforços para a alfabetização de camadas cada vez mais alargadas da população portuguesa. A publicação, em 1877, da célebre Cartilha Maternal, método de ensino da leitura verdadeiramente revolucionário no panorama pedagógico nacional, constituiu um marco importante desse processo. Devido, em parte, à sua ação de pedagogo, em 1895 foi agraciado com várias homenagens à escala nacional, entre as quais a de sócio honorário da Academia Real das Ciências e do Instituto de Coimbra.
Como poeta, o seu lirismo intimista versa constantemente sobre o amor, e por vezes perpassa um sentido de plácida religiosidade, exprimindo-se sempre num estilo simples. João de Deus, que Antero considerava, já em 1860, "o poeta mais original do seu tempo", defendeu e praticou um lirismo depurado, inspirado, a exemplo de Garrett, na lírica tradicional portuguesa e na obra camoniana, de onde recuperaria o soneto como um dos seus géneros de eleição.

Fonte: Infopédia

Fotos do álbum em BD "João de Deus - A Magia das Letras" de José Ruy

Cortesia de Tita Fan

sexta-feira, 8 de março de 2019

We can do it!

«Até à década de 70, na classe social a que eu pertencia, era escasso o número de mulheres que faziam uma escolha de vida idêntica à minha, ou que alinhavam nas iniciativas da Oposição Democrática. Havia uma espécie de cerco social, familiar e religioso, a entrincheirá-las – mesmo nas hostes oposicionistas da geração dos mais velhos, reféns de uma moral social, mais ou menos assumida, em que “a política era para os homens, e à mulher cabia um papel estabilizador da família, o amparo dos filhos e pais e o repouso do guerreiro”. 

Talvez por isso, são bastante conhecidas as mulheres que, durante o fascismo, se destacaram publicamente, e a sua memória individual tem sido, de algum modo, preservada. Se, hoje em dia, falamos de mulheres na oposição ao regime – ligadas a diferentes sectores ideológicos – há, de facto, dezenas de nomes de dirigentes estudantis, de prestigiadas figuras políticas e de intelectuais que nos vêm à cabeça: já desaparecidas ou ainda vivas, integram o património humano da Resistência urbana contra a ditadura. E, no entanto, desde a década de 40, era bem mais expressiva a representação das mulheres trabalhadoras em muitas regiões do país, nas lutas económicas e nas greves, quer operárias, quer na agricultura. 

Durante a ditadura fascista, a ala das mulheres do Forte de Caxias espelhava frequentemente essa realidade. Mulheres sem nome escrito na memória da oposição democrática. A Catarina Eufémia cedo se tornou um exemplo dessas outras combatentes. Assassinada a tiro pela GNR, quando reclamava um mísero aumento para as ceifeiras do latifúndio em que era assalariada, surgiu, ainda sob o fascismo, como ícone dos duros combates travados por elas, pelo direito ao trabalho e por um salário minimamente condigno. Porém, haverá centenas e centenas de mulheres que não foram nunca homenageadas; a quem o estado democrático não deu nunca voz na comunicação social; e que, só pontualmente, testemunharam publicamente as suas vivências. São a face feminina de um sem número de participantes activos nas lutas contra a ditadura - obreiros, eles e elas, das condições para a implantação da democracia. Ao longo de 48 anos, houve milhares de pessoas que foram detidas, que foram presas e torturadas, que morreram, que foram barbaramente espancadas, que sofreram o exílio, que foram expulsas do ensino, que perderam o trabalho, que se recusaram a partir para a guerra contra os povos das colónias. São batalhões de mulheres e homens abnegados, devotados a uma causa, sem anseio de heroicidade. Pagaram o custo da repressão por darem passos em frente, arriscando tudo, empenhando-se em lutas por melhores condições de vida e de ensino e por direitos de cidadania, na perspectiva de virem a alcançar um estado de direito, em paz, em democracia e com liberdade. Lutas que foram fragilizando o regime. A Revolução de Abril não nasceu do nada.
Mas a repressão e a brutalidade das polícias políticas e afins abatiam-se ferozmente sobre as mulheres, qualquer que fosse a sua origem social, sempre que se atreviam a enfrentar a ditadura. Com especificidades que faziam delas vítimas de violência acrescida, pela sua condição de mães, pela sua maior fragilidade física, pela sua maior vulnerabilidade. A condição feminina e a maternidade tornavam-nas alvos de um tratamento especial. No momento da prisão, nos interrogatórios e na tortura, muitas mulheres eram ameaçadas, chantageadas e humilhadas. Eles ajustavam, criteriosamente, a cada estrato social, as ameaças que faziam, os espancamentos, as palavras que usavam, as ordens que davam. Mas as torturas eram psicologicamente estudadas para nos provocarem na nossa fragilidade física e nos violarem no nosso pudor feminino, com o objectivo de verem a primeira cedência na firmeza que os desesperava. Depois, era a escalada da violência. Se é sinistro todo historial repressivo da PIDE, é aterradora a narrativa que nos chega de mulheres vítimas das atrocidades a que foram submetidas. Sobressaem como particularmente maquiavélicas.

O encarceramento de companheiras com os seus filhos tornava extraordinariamente doloroso o tempo de prisão a que eram submetidas. Vivi durante meses numa cela com a Maria, uma trabalhadora rural que tinha consigo uma criança de cerca de um ano e meio. Quatro metros quadrados, se tanto, que mãe e filho partilhavam com mais duas presas. Eram já perturbantes os sinais de transtorno psicológico da criança e continuava sem poder ir ao recreio e privada de espaço e de sol.

Parecendo condenadas a permanecerem ocultas na História recente do nosso país, estas mulheres vêm, aos poucos, saindo do anonimato. Acontece pela escrita de memórias de antifascistas, ou em documentos cinematográficos como o de Susana Sousa Dias, mas é sobretudo pela mão de historiadores (nomeadamente de Irene Pimentel, uma mulher que não pára na sua investigação apontada ao fascismo) que vemos nomes e factos a emergirem para níveis de divulgação.

Estou certa de que as crianças e os jovens precisam deste género de testemunhos, e de narrativas que ultrapassem as “frases feitas”, que pouco lhes dizem, para se abrirem ao conhecimento da realidade da ditadura de Salazar e Marcelo Caetano. Só assim os parágrafos frios e secos dos manuais escolares - em que se aborda este período negro da História de Portugal - ganham, aos seus olhos, vida e emoção. Há uma História viva ainda ao alcance destes jovens, o que é meio caminho andado para a motivação que, no futuro, pode fazer deles os ativistas que hão-de render-nos num movimento que não deixe apagar a memória.»
(Excerto de uma intervenção na UMAR, em Novembro de 2012)

A verdade sobre o Dia Internacional da Mulher


Durante séculos, o papel da mulher incidiu sobretudo na sua função de mãe, esposa e dona de casa. Ao homem estava destinado um trabalho remunerado no exterior do núcleo familiar. Com o incremento da Revolução Industrial, na segunda metade do século XIX, muitas mulheres passaram a exercer uma atividade laboral, embora auferindo uma remuneração inferior à do homem. Lutando contra essa discriminação, as mulheres encetaram diversas formas de luta na Europa e nos EUA.
A lenda do Dia Internacional da Mulher como tendo surgido na sequência de uma greve, realizada em 8 de Março de 1857, por trabalhadoras de uma fábrica de fiação ou por costureiras de calçado - e que tem sido veiculada por muitos órgãos de informação - não tem qualquer rigor histórico, embora seja uma história de sacrifício e morte que cai bem como mito.
Em 1982, duas investigadoras, Liliane Kandel e Françoise Picq, demonstraram que a famosa greve feminina de 1857, que estaria na origem do 8 de Março, pura e simplesmente não aconteceu, não vem noticiada nem mencionada em qualquer jornal norte-americano, mas todos os anos milhares de órgãos de comunicação social contam a história como sendo verdadeira («Uma mentira constantemente repetida acaba por se tornar verdade»).
Verdade é que em 1909, um grupo de mulheres socialistas norte-americanas se reuniu num "party’, numa jornada pela igualdade dos direitos cívicos, que estabeleceu criar um dia especial para a mulher, que nesse ano aconteceu a 28 de Fevereiro. Ficou então acordado comemorar-se este dia no último domingo de Fevereiro de cada ano, o que nem sempre foi cumprido.
A fixação do dia 8 de Março apenas ocorreu depois da 3ª Internacional Comunista, com mulheres como Alexandra Kollontai e Clara Zetkin. A data escolhida foi a do dia da manifestação das mulheres de São Petersburgo, que reclamaram pão e o regresso dos soldados. Esta manifestação ocorreu no dia 23 de Fevereiro de 1917, que, no Calendário Gregoriano (o nosso), é o dia 8 de Março. Só a partir daqui, se pode falar em 8 de Março, embora apenas depois da II Guerra Mundial esse dia tenha tomado a dimensão que foi crescendo até à importância que hoje lhe damos.
A partir de 1960, essa tradição recomeçou como grande acontecimento internacional, desprovido, pouco e pouco, da sua origem socialista.
Se consultarmos o calendário perpétuo e digitarmos o ano de 1857, poderemos verificar que o 8 de Março calhou a um domingo, dia de descanso semanal, pelo que, em princípio, nunca ocorreria uma greve nesse dia. Há quem argumente, no entanto, que, durante o século XIX, a situação da mulher nas fábricas dos Estados Unidos era de tal modo dramática que trabalharia 7 dias por semana.
Desde 1975, em sinal de apreço pela luta então encetada, as Nações Unidas decidiram consagrar o 8 de Março como Dia Internacional da Mulher.

Fonte: www.leme.pt
- Pesquisa efectuada por Maria Luísa V. Paiva Boléo

Cortesia de Tita Fan

Direitos das Mulheres


Soube do e-mail do ministro da Educação para que todos os funcionários da Av. 24 de Julho se concentrassem na esquina com a Av. Infante Santo às 12 horas para honrar o dia de luto nacional pelas vítimas da violência doméstica, que, infelizmente, continua a registar números absolutamente alarmantes.
Não só hoje mas em todos os restantes dias do ano, é mais do que tempo de encarar as mulheres como parceiras, com direitos iguais e não mais como seres inferiores e sacos de pancada.

Em honra do Dia Internacional da Mulher


Vamos celebrar as contribuições das mulheres que mudam o nosso mundo e o nosso futuro. 
"Não esperem que outra pessoa venha falar por vocês. As vossas ações é que mudam o mundo."
Malala Yousafzai

Às Mulheres


“A mulher não é só casa
mulher-loiça, mulher – cama
ela é também mulher-asa,
mulher-força, mulher-chama
E é preciso dizer
dessa antiga condição
a mulher soube trazer
a cabeça e o coração
Trouxe a fábrica ao seu lar
e ordenado à cozinha
e impôs a trabalhar
a razão que sempre tinha
Trabalho não só de parto
mas também de construção
para um filho crescer farto
para um filho crescer são
A posse vai-se acabar
no tempo da liberdade
o que importa é saber estar
juntos em pé de igualdade
Desde que as coisas se tornem
naquilo que a gente quer
é igual dizer meu homem
ou dizer minha mulher”
(José Carlos Ary dos Santos)

Dia Internacional da Mulher


"Merece uma pequena homenagem: a republicação de uma ilustração de PEARL, a musa do blogue PÉROLA DE CULTURA, que produzi há anos para o 2º aniversário deste blogue."

Luís Diferr

A todas as mulheres do mundo.

(Pintura de autor que não foi possível identificar)
Agora que sinto amor
Tenho interesse no que cheira.
Nunca antes me interessou que uma flor tivesse cheiro.
Agora sinto o perfume das flores como se visse uma coisa nova.
Sei bem que elas cheiravam, como sei que existia. 
São coisas que se sabem por fora.
Mas agora sei com a respiração da parte de trás da cabeça.
Hoje as flores sabem-me bem num paladar que se cheira.
Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver.
Alberto Caeiro, in "O Pastor Amoroso"

À memória de Maria João Seco, que partiu a 27 de Fevereiro de 2018.

segunda-feira, 4 de março de 2019

As máscaras que usamos



Ah quantas máscaras e submáscaras,
Usamos nós no rosto de alma, e quando,
Por jogo apenas, ela tira a máscara,
Sabe que a última tirou enfim?
De máscaras não sabe a vera máscara,
E lá de dentro fita mascarada.
Que consciência seja que se afirme,
O aceite uso de afirmar-se a ensona.
Como criança que ante o espelho teme,
As nossas almas, crianças, distraídas,
Julgam ver outras nas caretas vistas
E um mundo inteiro na esquecida causa;
E, quando um pensamento desmascara,
Desmascarar não vai desmascarado.

Fernando Pessoa

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

BREVE O DIA, BREVE O ANO, BREVE TUDO


Breve o dia, breve o ano, breve tudo.
Não tarda nada sermos.
Isto, pensando, me de a mente absorve
Todos mais pensamentos.
O mesmo breve ser da mágoa pesa-me,
Que, inda que magoa, é vida.


(27-9-1931)

RICARDO REIS, in ODES DE RICARDO REIS. 
FERNANDO PESSOA (Ática, 1946 (imp.1994)


Pintura: Tamara de Lempicka, "La Dormeuse"

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Pérola de Cultura - 9 anos a escrevinhar


Faz hoje 9 anos que criei o Blogue "Pérola de Cultura", com a consultoria do meu querido colega e amigo Francisco Trindade, padrinho do Blogue. Durante vários anos por lá escrevi diariamente. Depois, como muitos outros, esmoreceu. Agora só ocasionalmente lá escrevo.
Contei com algumas preciosas colaborações. A todos, os meus agradecimentos por esses bons e ativos tempos. Agradeço também a todos os leitores e comentadores. E até aos que liam sem comentar.
Uma palavra especial de gratidão aos amigos bloggers que ajudaram a divulgar a existência da "Pérola de Cultura": Anabela MagalhaesPaulo GuinotePaulo PrudêncioDomenico ConditoLuis Alves da CostaJoão Amaral, Bago de Romã, Ema e tantos outros.
Foram anos bonitos de estreita colaboração com Luís Diferr, Tita Fan, Carmela, Gabi, P.D., L.A., José Ruy, Tacci, O Que Não Sabe Pensar e Becas.
Em 2009 e nos anos seguintes o Blogue Pérola de Cultura cumpriu o seu papel.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Star Wars VIII - breves notas


Confesso que nunca fui fã da série Star Wars. Mesmo assim, dei por mim a ver vários dos filmes.
 
Após ouvir alguns entusiasmados elogios, decidi conhecer o capítulo VIII, para ver o último trabalho de Carrie Fisher e também pela curiosidade de saber como ficaria Star Wars sem Han Solo e sem Darth Vader, duas personagens centrais e emblemáticas nesta saga.

A série, criada no final da década de 70, viu os atores envelhecerem e as personagens irem morrendo. Hoje Star Wars já não conta com James Earl Jones (a voz de Darth Vader), nem com Harrison Ford (Han Solo) e, a respeito da saudosa Princesa Leia, parece realmente que Carrie Fisher estava já no fim da linha. A atriz aparece em visível declínio físico, muito envelhecida para a sua idade, com uma voz sumida e o  rosto bastante inexpressivo pelo excesso de plásticas. Mark Hamill, continua muito bem como o incontornável Luke Skywalker, agora convertido num eremita de meia-idade, habitando uma ilha periférica da galáxia. Assumindo o desgaste causado por muitas batalhas, e após a última luta, parte serenamente para o Éter, envolvido por um lindo pôr-do-sol.

Assim a história já vai na terceira geração. Já não existem Darth Vader, e a partir de agora nem o seu filho, Luke Skywalker, que o combateu e quase o matou. O lado negro da força aparece, neste capítulo, personificado pelo filho de Han Solo, Kylo Ren, que matou o pai.

Aqui podemos perguntar-nos o porquê desta tragédia de sabor edipiano, repetida num macabro xadrez de lutas entre o Bem e o Mal, personificadas entre pais e filhos. 

Kylo Ren é comandado pelo terrível general do lado negro da Força, interpretado por Andy Serkis, que já conhecíamos da personagem Smeagle, o nojento, ambicioso e avarento Golum da trilogia "O Senhor dos Anéis".

No final deste capítulo vemos a princesa-general Leia, sereníssima, apesar de triste, perante o pressentimento de Rey sobre a morte de Luke Skywalker; como se esta desmaterialização fosse uma inevitabilidade e houvesse um futuro promissor na própria Rey, a nova Jedi. Leia diz: "The sparkle is out", diz Leia. Mas quando Rey lhe pergunta se haverá chances de continuar a luta, esta responde-lhe: "We have everything we need".

Numa visão superficial dos filmes Star Wars, tendemos a deixar prender a atenção sobre a miríade de efeitos especiais produzidos pela fabulosa Industrial Light and Magic, de George Lucas. Esta empresa de conteúdos digitais, além de mobilizar muitas centenas de artistas nestas grandes produções, consegue criar ilusões fantásticas, que ultrapassam tudo o que pudéssemos imaginar. Desde as personagens mais bizarras, que cruzam várias espécies de animais inimagináveis, como, por exemplo, raposas de cristal ou dinossauros mamíferos que alimentam Luke Skywalker com leite verde, há de tudo em Star Wars. 

Quanto aos humanóides, nem é bom falar, pois há criaturas que fariam alguns autores de Banda Desenhada de fantasia parecerem meninos de coro. Algumas sequências, principalmente a do Casino, remetem-nos para a história de BD fantástica “Delirius” de Philippe Druillet, de 1973, e também para séries posteriores, como “Valerian”, de Mezières e Christin ou “Os Companheiros do Crepúsculo” de François Bourgeon. Para já não falar nos robots semi-humanos de Moebius.

É preciso pois fazer um esforço de descentramento da atenção sobre estas fantasias e tentar descortinar a substância da narrativa por detrás de toda aquela  "masquerade"!

Apesar de alguns excessos de efeitos especiais a que nos habituou a estética muito própria desta saga, há aspetos positivos a salientar. Desde logo haver um número razoável de filmagens em cenários reais que destacam a Natureza em locais de paisagem privilegiada, o que constitui sempre uma mais-valia em cinema. As imagens das falésias agrestes sobre o mar, as encostas pedregosas e íngremes onde Rey  vai encontrar Luke Skywalker, as ilhas escarpadas que de lá se avistam, o lago salgado da última batalha ou as grutas, foram obtidas em filmagens na Irlanda, na Islândia, na Croácia e na Bolívia. As imagens de estúdio foram filmadas em Londres. Esta mistura produziu um resultado fabuloso. Caso contrário, eu jamais aguentaria quase três horas de um filme cujo género nem sequer aprecio. 

Para os adeptos dos efeitos especiais, as cenas de tiroteio, as naves monstruosas, as máquinas de guerra infernais e as armas de todo o tipo, são servidos em dose farta e com generosidade. Uma tentação para os jovens que apreciam o cosplay e que aqui podem vir abastecer a inspiração. 

Enfim, perguntada se gostei desta história, respondi que ela deve ter sido escrita por um tipo louco varrido, com todo o respeito por Rian Johnson…

A minha leitura é impressiva e emocional? Talvez. Sou muitas vezes acusada de ser adepta do mais estrito realismo no cinema e na literatura. Também é verdade. Não aprecio as narrativas do fantástico a tender para a ficção científica, a não ser em casos raros e verdadeiramente especiais. Este é um deles.

Este filme, sendo do fantástico, mistura misticismo com ficção científica, coloca a alta tecnologia do futuro no passado, desconstrói as nossas referências espaço-temporais, mas prende a atenção pela dicotomia que está por detrás das aparências. Todas as guerras têm dois lados, jogos de poder, lutas territoriais, questões de domínio, etc. Mas em Star Wars há, mais do que isso: há uma dialética de valores do humano, pelo que a guerra fundamental é entre o Bem e o Mal, ou, dito de outra forma, os dois lados da Força.

Vê-se como é fácil aos humanos resvalar para aquilo que os antigos chamariam a "tentação do mal"; trata-se não só da vaidade, da ambição e da ganância, mas também do apelo inexorável pelo mais fácil, o menos trabalhoso, o mais lucrativo, o que exige menos esforço e menos empenho ou educação do próprio. É isto que transparece nesta alegoria do Mal, aqui chamada o "lado negro da Força". O Bem, por seu lado, exige ponderação, persistência, trabalho, educação e esforço próprios, enfim, um longo e por vezes penoso caminho de ascese, que muitos recusam. E é precisamente desta recusa e das tentações do facilitismo que resulta a crise de valores que hoje vivemos. Dito de outra forma, é este o lado negro da Força que hoje temos e que resulta da inveja e da ganância. E a consequente banalização do Mal, de que tanto falava Hannah Arendt.

Apesar de, como dizem, "eu não ser de fantasias", às vezes apetecia-me ser um(a) duende, viver numa floresta encantada, rodeada de seres do Bem e empunhar, quando necessário, o meu sabre de luz para enxotar para longe o lado negro da Força, que existe de facto e que, assim que baixamos a guarda, nos vem arranhar a pele.

May the Force be with you, folks!    

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Viva a República!

Continua a fazer sentido a defesa dos ideais republicanos. A República portuguesa faz hoje, dia 5 de Outubro, 107 anos e, felizmente, o feriado nacional foi reposto. É uma questão de História e de valores. E sobretudo de respeito pela memória de um povo.

É importante manter este feriado, tal como o do dia 1 de Dezembro, em que uns bravos restauraram a independência nacional face ao domínio espanhol.
Infelizmente, Castela, até hoje, em 2017, ainda não perdeu as tendências de domínio ibérico a todo o custo, nem que para isso tenha de usar a força. São tristes os conflitos na Espanha e oxalá não se repita uma guerra civil de má memória. Se a Catalunha decretar a independência, isso pode transformar-se num rastilho para outras províncias, como o País Basco ou a Galiza.
Não concordo nada com alguns comentadores portugueses que tenho ouvido nos media, como por exemplo o historiador Jaime Nogueira Pinto, que defende que a posição deve tomar deve ser aquela que for mais vantajosa para Portugal. Portugal recuperou a sua independência em 1640; tem mantido desde então a sua soberania. Se pensássemos apenas em termos de vantagens, talvez fosse vantajoso que fizéssemos parte de uma espécie de União Ibérica, assim tipo um grande país.
Mas é isso que queremos? Não seria isso andarmos para trás uns séculos?

quarta-feira, 8 de março de 2017

Recordar Marie Curie em homenagem ao Dia da Mulher




Em resposta ao deputado polaco do Parlamento Europeu, que defendeu que as mulheres, "por serem inferiores, mais pequenas, mais fracas e menos inteligentes, devem ganhar menos", só me apetece recordar ao senhor e a todos os machistas e retrógrados da Polónia que foi uma polaca a única mulher da História a ganhar dois prémios Nobel da Física, Marie Curie.
Foi Maria Sklodosvska Curie quem descobriu a radioatividade.
E era uma mulher pequenina! Mas uma grande cientista.
Tome lá, senhor deputado Korwin-Mikke, para lhe avivar a memória.
E tenha vergonha e juízo, que já tem idade suficiente para isso.

Dia Internacional da Mulher 2017

Carolina Beatriz Ângelo e Ana de Castro Osório - 1911

Enquanto uma em cada três mulheres no mundo sofrer violência doméstica;
enquanto por cada Euro ganho por um homem, a mulher receber apenas 0,83 cêntimos;
enquanto para a mulher ganhar o mesmo que um homem, tenha de trabalhar mais 61 dias por ano;
enquanto todos os anos morrerem milhares de mulheres vítimas de mutilação genital feminina;
enquanto houver discriminação no acesso aos postos superiores no trabalho e na política;
enquanto houver muitos milhares de mulheres que perdem o emprego por estarem grávidas;
continua a fazer todo o sentido assinalar o Dia Internacional da Mulher.

É bom ter em mente estes dados quando ouvirmos dizer que não se justifica continuar a comemorar este dia.
Muitas morreram para que hoje nós possamos gozar de alguns direitos adquiridos.
Por isso não se trata apenas de festejar, mas de continuar a lutar pela igualdade de direitos e oportunidades.
Feliz Dia da Mulher!

Daniel Craig, como 007, em apoio à Igualdade das mulheres





Traduzi, o mais fielmente possível, o pronunciamento de Judi Dench questionando Daniel Craig, que se vestiu com roupas femininas, numa campanha pela Igualdade das Mulheres:

“Are we equals, 007?


O homem ainda ganha mais do que a mulher pelo desempenho da mesma tarefa.
Ela tem 1 em 100 chances de ter uma carreira política ou tornar-se diretora de uma empresa.
Como homem tens muito menos chances de ser julgado por comportamento promíscuo e praticamente nenhuma chance de sofrer assédio sexual no teu local de trabalho.
30.000 mulheres no Reino Unido perdem os seus empregos por estarem grávidas, enquanto é praticamente impossível um homem ser prejudicado na sua carreira por tornar-se pai.
O mundo mudou, mas em 2011 os números persistem:
2/3 do trabalho bem feito é ainda desempenhado pelas mulheres no mundo, mas apenas 10% recebem proventos dele e apenas 1% detêm a sua propriedade.
Mas isto não diz respeito apenas a questões de poder ou dinheiro.
Em cada ano 70 milhões de raparigas no mundo são privadas de escolaridade básica e estima-se que outros 60 milhões são sexualmente molestadas no seu caminho para a escola.    
Nós temos medo de andar nas ruas à noite sozinhas e algumas de nós ainda temos mais medo de regressar sozinhas a casa.
Uma em cada quatro são vítimas de violência doméstica no Reino Unido e todas as semanas duas mulheres são mortas pelos atuais ou ex-companheiros.

Então 007 somos nós iguais?
Nós dois, sim. Mas nunca deixemos de o perguntar.”

Judi Dench, adjunta de James Bond, o agente secreto 007

8 de Março de 2011, pelo Dia Internacional da Mulher

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Indignação



Indignaram-me as condecorações de Maria de Lurdes Rodrigues e Nuno Crato, antigos ministros de Educação, pelo presidente cessante. Para mim, Cavaco termina o mandato com mais esta nódoa: a de agraciar com medalhas de honra por bons serviços prestados ao país duas das pessoas que mais mal conseguiram fazer à Escola pública e aos professores.
Há quem tente hoje em dia relativizar os "males" que MLR impôs aos docentes e à escola comparando-os com os de Nuno Crato, eventualmente ainda piores. Mas, não nos esqueçamos de que, por muito mau que Nuno Crato tenha sido, isso não pode de modo algum isentar Maria de Lurdes Rodrigues de todos os males que fez à escola pública e sobretudo aos professores. Acrescento: nunca tinham existido tantos suicídios de professores como no tempo negro que essa senhora nos fez passar. Nunca me poderei esquecer disso, nem do seu ar de freira, de discurso auto-vitimizador, do sarcasmo, do desprezo e da grosseria com que os seus secretários de estado zurziram publica e sistematicamente a classe docente, começando pela infame campanha de descredibilização da sua imagem junto da opinião pública e dos media.
O pior modelo de avaliação de desempenho docente alguma vez imposto foi o da vigência de MLR. A ideia dos professores titulares e do respetivo e absurdo concurso, idem. Foi ela quem quis estratificar os professores numa cadeia hierárquica dentro da escola, comparando-os a generais e soldados, como na tropa, e como se a escola fosse um quartel. Foi ela quem instituiu o modelo de gestão concentrando poderes numa só pessoa, como se da administração de uma empresa se tratasse. Foi ela que começou por fechar escolas. Isabel Alçada continuou. Foi ela quem começou a falar em agrupamentos. Isabel Alçada continuou. Foi ela que começou por tentar esvaziar, em suma, toda a democraticidade interna das escolas. Quando chega Nuno Crato encontra já o terreno todo minado. Transforma os agrupamentos em mega-agrupamentos, aumenta o número de alunos por turma, congela para sempre as progressões na carreira, que as suas antecessoras tinham iniciado, e lança no desemprego milhares de professores.
Manobras escusas como a requalificação, reintegração ou rescisão "amigável" não são mais do que formas de despedir pessoas, reduzindo ao mínimo os quadros e passando todos a "contratados sem termo fixo".
Enfim, poderia continuar aqui a desfiar um rosário de males que estas pessoas vieram impondo ao ensino público e aos professores, sempre em nome de supostas "melhorias", aumento da qualidade na docência, diminuição do abandono escolar ou outras patranhas do género.
Não sabe Cavaco quantas doenças profissionais estas pessoas causaram aos professores, desde depressões até suicídios, como nunca antes se tinham registado? 
Não sabe Cavaco que foi a partir do tremendo desrespeito com que Lurdes Rodrigues e seus acólitos trataram os docentes que aumentaram do forma exponencial agressões de alunos e pais a professores, de uma forma nunca vista neste país? 
Não sabe Cavaco que, mais do que nunca houve uma avaliação absurda e até inconstitucional, (como se veio a provar, sobre professores contratados, por exemplo), assim como despedimentos, erros concursais, atropelos e processos mais do que turvos na contratação de docentes, como nunca dantes se tinha visto? 
Não sabe Cavaco que foi durante a vigência de Lurdes e Crato, os seus medalhados, que mais professores tiveram de abandonar as suas famílias e as suas casas, para irem dar aulas a 200, 300 ou 400 km da sua residência? 
Não sabe Cavaco quantos casais Crato e Rodrigues ajudaram a separar ou divorciar, ou quantas crianças retiraram do colo das suas mães? 
Não sabe porventura Cavaco que durante a vigência de Crato e Rodrigues a indisciplina nas Escolas atingiu números e gravidade nunca dantes vistos em Portugal?
Quantas pessoas Crato e Rodrigues obrigaram a ter de pagar para trabalhar, colocados de modo a que tivessem de pagar duas rendas, fazer face a consumos de gasolina e portagens impossíveis de aguentar?
Não sabe Cavaco que muitos professores, não tendo emprego no sistema público, tiveram de entregar-se nas mãos de máfias de alguns colégios privados, onde são objeto de quase escravatura, desde abusos nos horários, até situações de assédio moral e chantagens de todo o tipo?
Não há dúvidas sobre os méritos que estes dois medalhados tiveram na vida das escolas e dos professores. 
Cavaco termina o seu mandato da pior maneira possível: legitimando e prestando honrarias à incompetência e à maldade. 
Parabéns ao Cavaco! Estas condecorações são bem o retrato de quem as atribuiu.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

A esperança ou a falta dela em mais um Natal


Há muitos meses que não vinha aqui escrevinhar. Mais exatamente desde Março passado.
Está a chegar mais um Natal e é sempre tempo de balanços. Vou omitir propositadamente as piores coisas que aconteceram, quer a mim, quer ao mundo durante o ano de 2015.
Do meu país, perdoem-me lá, também não falarei a não ser indiretamente e naquilo que me diz respeito.
Entretanto, nenhum de nós teve a desdita de sofrer um AVC ou um acidente nalgum fim-de-semana em que não há certos serviços de urgência. Nenhum de nós foi à falência, embora tenhamos de pagar as dos Bancos. Nenhum de nós foi preso, nem morto por algum jihadista com a pontaria afinada. Temos sido muito explorados, isso sim, e empobrecidos pela austeridade, afinal mal ou tardiamente testada, e com consequências funestas. Não recuperaremos o nosso nível de vida anterior, embora não tenhamos gasto acima das nossas possibilidades nem nos tenhamos endividado. Só que vivíamos com expetativas e até essas nos foram sonegadas. Porém, sobrevivemos, com mais ou menos cabelos brancos, mais anti-depressivo, menos ansiolítico, às frustrações e desenganos de uma meia-idade mais frustrada do que realizada.
Apesar de tudo, há a família. Há os miúdos que vão crescendo e já parecem homens e jovens mulherzinhas. E há meia dúzia de bons amigos que nunca se esquecem de nós.
Apesar de tudo, isso junto já conforta um pouco a alma nesta quadra.
Boas Festas a todos.

sábado, 28 de março de 2015

Anjos negros da morte

Há tempos escrevi aqui e aqui sobre a minha incredulidade sobre este tipo de tragédias.
Infelizmente, há dias tornei a sentir-me atónita com outra tragédia, ainda mais mortífera.
Embora de contornos diferentes, esta última foi perpetrada por alguém com um nome parecido.
Na Noruega foi Anders, na Alemanha Andreas. Na Noruega foi Breivik, na Alemanha, Lubitz...
Em ambos os casos, vinte e poucos anos, caras de anjos, rapazes bonitos, com um ar normal.
Bons filhos, cidadãos aparentemente cordiais, bons vizinhos, socialmente respeitados e, no entanto... assassinos!

Juro que até senti um arrepio, como se, de repente, estivesse a assistir a um déjá-vu, noutro cenário.
As semelhanças são evidentes nos nomes, mas não só: embora com diferenças nas motivações e nas personalidades, assistimos a duas mortandades de inocentes protagonizados por jovens sociopatas.

O primeiro disparou rajadas de balas sobre dezenas de jovens inocentes num acampamento de Verão numa ilha, após ter colocado um engenho explosivo de fabrico caseiro no edifício do governo da Noruega. O segundo despenhou propositadamente um avião Airbus sobre uma montanha dos Alpes há dias, matando 150 pessoas. O primeiro agiu por razões de racismo e xenofobia. Não queria ver o seu país "invadido" por outras raças, línguas e cores e achou assim que podia combater a tendência multicultural da Escandinávia. O segundo estava doente, deprimido, com dor de corno, sei lá, de mal com a vida, quiçá com o emprego. Não achou melhor modo de se suicidar do que levando para a morte consigo uma centena e meia de inocentes que viajavam de Barcelona para Dusseldorf. E que não tinham nada a ver com o seu surto psicótico, quadro de ansiedade ou crise amorosa.

Claro que todos temos livre-arbítrio e somos donos do nosso corpo e da nossa vida. Penso mesmo que o suicídio deve ser entendido como um direito. Mas não temos direito a dispor da vida dos outros. Daí que eu compare este crime com o da Noruega. Não deixam de ser ambos homicídios em massa, premeditados e meticulosamente executados.

Para preparar este tipo de atos é preciso que a frieza e o calculismo se sobreponham a toda a sanção moral e a toda a consciência ética. É preciso estar despido de toda a roupagem cívica e educacional que orienta o indivíduo para aquilo que é o mais elementar princípio de cidadania: o respeito pelo outro.

O valor mais universal e tacitamente aceite como supremo e inquestionável, que é o valor da vida, nestes casos, foi completamente subjugado a mentes perturbadas, de mal com o mundo e com raiva à humanidade.

Uma questão de espinha dorsal

Paulo Jorge Alves Guinote, 40 e tal anos, professor, historiador, pai, marido e excelente colega.
Este perfil poderia ser apenas de mais um entre tantos outros homens, intelectuais desta geração.
Mas ele era (e sempre será) o dono do Umbigo, o Blogue de professores mais lido do país.
Começou pelas questões polémicas do ensino, rapidamente se tornou um Blogue politicamente ativo, pelo pendor crítico que imprimiu aos seus posts e uma referência para a classe docente.
O talento do Paulo para intervir nas questões do ensino não passou despercebido para os media e foi rapidamente reconhecido como um parceiro a auscultar, a consultar, a ouvir.
Credibilidade foi a palavra-chave. Mas, para mim, o Paulo também revelou coragem, acutilância, sentido de oportunidade e, sobretudo, sempre, e mesmo que fosse contra-corrente, amor à verdade.
Pagou algumas faturas por causa disso; é que isto de se insistir em manter direita a espinha-dorsal faz com que a consciência durma tranquila no travesseiro, mas os sucessivos golpes baixos vão cansando, desgastando. E as desilusões também.
Pode ser, quem sabe, que seja um mero interregno e não um adeus.
Por ora, O Umbigo fechou. Mas a tua espinha-dorsal não dobrou.
Bem-hajas pela tua persistência e até sempre. Noutras chafaricas.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Outra boa surpresa do mundo árabe


Ainda a respeito de surpresas provenientes do mundo árabe, não poderia deixar de assinalar esta atitude de mais uma mulher corajosa. Enfim alguma coisa parece estar a mudar no que diz respeito ao domínio dos homens mais conservadores sobre as mulheres. 
Sem dúvida só as mais instruídas conseguem ter a coragem e a assertividade necessárias para enfrentar as atitudes de prepotência, arrogância a autoritarismo tradicionais de muitos homens do mundo árabe, particularmente os mais religiosos, conservadores e retrógrados. Este foi um sheik sunita...
Rima Karaki, jornalista libanesa é um exemplo a seguir. Veja aqui

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Do horror em Paris e algumas boas suspresas

Já foi dito e escrito quase tudo sobre os trágicos acontecimentos dos últimos dias em Paris.
A intolerância e o racismo, a violência e obscurantismo, a liberdade de imprensa ou os seus limites, o retrocesso civilizacional de quem quer reinstaurar a pena de morte, o circo mediático em torno de dezenas de chefes de Estado, uns mais sinceros, outros mais hipócritas, e uns que mais valia terem ficado em casa, já que, direitos humanos são coisa com a qual não costumam propriamente tomar o pequeno almoço.

De qualquer modo saliento duas ou três notas positivas a respeito do desempenho de alguns políticos:

1ª) a comparência (quase imediata) junto do escritório do Charlie Hebdo, vandalizado e objeto de uma carnificina, do presidente da república François Hollande.

2ª) a assunção (quase imediata) das responsabilidades pela falha na segurança nacional que permitiu a ocorrência de atentados perpetrados por criminosos já referenciados, por parte do primeiro-ministro Manuel Vals.

3ª) a participação na manifestação de Pedro Passos Coelho e Assunção Esteves, em representação de do Estado português. Não simpatizo com nenhum dos dois, mas gostei de vê-los por lá nesta ocasião.

4º) a participação do casal real da Jordânia, do qual já tinha boa impressão, em particular de Rânia, sobre quem já tinha escrito aqui em 2009 por ocasião da sua visita a Portugal.
Ao contrário das tradicionais rainhas árabes, que sempre vivem à sombra dos maridos e submetidas à tradição, Rânia da Jordânia continua a surpreender-me pela positiva.
Foi a primeira vez que vi uma rainha a desfilar numa manifestação, ainda mais sendo uma mulher árabe. A sua posição permite-lhe, felizmente, lutar e defender alguns direitos das mulheres no mundo árabe, como o direito à instrução e a uma participação ativa no mundo do trabalho.
Ficam aqui as suas palavras na página oficial do Facebook:
"As a Muslim, it pains me when someone derides Islam and my religious beliefs. It also pains me when someone derides other religions and other people’s religious beliefs. But what offends me more, much more, are the actions of the criminals who, this week, dared to use Islam to justify the cold-blooded murder of innocent civilians. This is not about Islam or being offended by the Charlie Hebdo magazine. This is about a handful of extremists who wanted to slaughter people for any reason and at any cost.
Islam is a religion of peace, tolerance and mercy. It is a source of comfort and strength for more than 1.6 billion Muslims – the same people who are shocked, saddened and appalled by the events in Paris this week.

Today, I join His Majesty King Abdullah in Paris to stand in solidarity with the people of France in their darkest hour... To stand in unity against extremism in all its forms and to stand up for our cherished faith, Islam. And so that the lasting image of these terrible events is an unprecedented outpouring of sympathy and support between people of all faiths and cultures."